Em entrevista à Bernard, o diretor executivo da ABSEL (Association for Business Simulation and Experiential Learning – EUA), Hugh Cannon, fala sobre novas linhas de pesquisa na área de simulação empresarial e esclarece conceitos como “paradoxo da complexidade”, “validade representacional” e “validade educacional”.
Que tipo de trabalho realiza a ABSEL e qual a sua função na organização?
Hugh Cannon – ABSEL é uma organização internacional dedicada a promover pesquisas direcionadas ao desenvolvimento, aplicação e avaliação de jogos de simulação de negócios (veja www.absel.org). Como diretor executivo, meu papel tem sido cuidar dos assuntos administrativos da organização. Procuramos melhorar a qualidade das pesquisas conduzidas pelos nossos membros e depois torná-las disponíveis para a comunidade.
No Brasil existe certa confusão entre os conceitos “jogos de empresa” e “simulação empresarial” Você acredita que a utilização de ternos alternativos, tais como, simulação gerencial, possam reduzir esta confusão?
Hugh Cannon – Concordo que podemos evitar confusão sendo mais precisos em como usamos os diferentes termos. Tecnicamente falando, uma “simulação” é simplesmente um modelo que representa um fenômeno atual. Uma “simulação empresarial” é uma representação de como um negócio opera. Assim, uma boa simulação pode ser usada para prever o que irá acontecer sobre um particular conjunto de condições. As simulações fornecem uma poderosa ferramenta para previsão de negócios, para avaliar as conseqüências de diferentes atividades empresariais, etc. Como resultado, são freqüentemente usadas como parte de um sistema de apoio às decisões no auxílio a gerentes.
Um “jogo de empresas” é uma aplicação especial da tecnologia de simulação empresarial para treinamento de gerentes. O jogo cria um tipo de laboratório onde gerentes podem administrar empresas, experimentando diferentes estratégias e táticas. O jogo é baseado em uma simulação que fornece feedback com relação às conseqüências das decisões dos jogadores, permitindo-os experimentar e responder uma grande faixa de diferentes problemas e situações.
Infelizmente o termo “jogo” freqüentemente conota algo que não é sério e profissional. Consequentemente, jogos de empresas são, às vezes, referidos como simulações gerenciais. Isto reflete o fato de que eles simulam as conseqüências de decisões gerenciais. Entretanto, uma simulação também pode ser usada como parte de um sistema de apoio às decisões, para ajudar a avaliar as conseqüências potenciais de diferentes decisões. Isto seria, tecnicamente, uma simulação gerencial, mas não um jogo de simulação de negócios. Apesar desta objeção, eu acho que “simulação gerencial” é um bom termo a ser usado quando discutindo jogos de simulação de negócios na maior parte das situações práticas.
Comente sobre a simulação gerencial como método de aprendizado gerencial.
Hugh Cannon – Simulações fornecem uma poderosa e relativamente barata ferramenta para ajudar gerentes a avaliar as conseqüências de suas decisões. Um estudante ou um gerente podem experimentar como é administrar uma empresa em diferente ramos, ou mesmo aprender sobre as conseqüências de diferentes decisões sem arriscar grandes perdas financeiras. Tudo isso tem muitas implicações educacionais.
Quais são as linhas de pesquisa mais recentes na área de simulação empresarial?
Hugh Cannon – Vejo três áreas que estão chamando mais atenção. Primeiro, um contínuo esforço para desenvolver modelos mais válidos – simulações que darão feedback mais realístico em resposta ao tipo de decisões tomadas na vida real. Por exemplo, o que acontece se um gerente escolhe em investir na lealdade do consumidor a longo prazo? Sua empresa pode não ser muito lucrativa no curto prazo, mas no longo prazo ela pode ser. Uma simulação deveria refletir os efeitos de curto e longo prazos das diferentes atividades gerenciais.
Segundo, vejo pessoas trabalhando para fazer simulações gerenciais mais compreensíveis e fáceis de usar. Um dos paradoxos de simulações é que, quando elas são muito complexas para refletir realisticamente o que acontece em uma empresa real, ficam tão complexas que um estudante não pode ver as conseqüências de suas decisões específicas. Os desenvolvedores de simulações estão trabalhando em várias abordagens para torná-las mais compreensíveis sem comprometer a exatidão.
Finalmente, pesquisadores estão trabalhando para desenvolver e validar métodos de utilização da simulação para avaliar competências gerenciais. A maioria dos pesquisadores concordam que simulações gerenciais desenvolvem competências. Entretanto, para usá-las para avaliação, devemos estabelecer indicadores de desempenho que realmente reflitam o que um gerente possa fazer no mundo real. Este é o maior desafio.
Como a introdução da simulação empresarial pode contribuir para a melhoria da qualidade dos cursos de administração e ajudar alunos a melhorarem o desempenho tanto dentro da universidade quanto na busca por um espaço de destaque no mercado de trabalho?
Hugh Cannon – As pessoas aprendem melhor fazendo. Simulações gerenciais impulsionam os alunos a realmente fazer o que os gerentes fazem. Os estudantes tomam decisões e obtém um retorno imediato com relação às conseqüências. Isso cria uma poderosa ferramenta de aprendizado, além de aumentar o interesse dos estudantes nos cursos, tornando-os mais reais e relevantes.
O senhor escreveu alguns artigos sobre avaliação da simulação. Comente sobre o significado dos conceitos de validação representacional e validação educacional de uma simulação.
Hugh Cannon – “Validade representacional” refere-se à exatidão com a qual a simulação representa o fenômeno sendo simulado. “Validade educacional” refere-se ao grau com que estudantes ou gerentes aprendem o que é para ser aprendido quando usam a simulação. Uma simulação pode ter uma alta “validade representacional”, mas pode ser tão complexa que as pessoas que a usam não podem ver (e consequentemente aprender) as conseqüências de suas decisões.
Em um dos seus artigos o senhor definiu o “paradoxo da complexidade” para os modelos de representação da realidade inseridos nos simuladores. Comente sobre o assunto.
Hugh Cannon – O paradoxo da complexidade refere-se ao fenômeno acima discutido: quando as simulações são complexas o bastante para representar o mundo real, são também complexas demais para os usuários a entenderem. Entretanto, isto também é verdadeiro para as organizações.
Podemos aplicar os mesmos princípios para simulações, que gerentes reais usam para fazer seus trabalhos nas empresas, como introduzir a noção de estratégia, onde uma simples decisão estratégica orienta um número muito maior de decisões de um nível inferior. Por exemplo, a decisão de uma liderança em qualidade, sugere que a empresa irá investir em produtos de alta qualidade, utilizar um alto nível de automação (para evocar economias de escala em mercado mais amplo), acarretando em maiores preços.
Outros métodos de tratar a complexidade incluem dividir as decisões em uma série de etapas lógicas, e fáceis de entender, para que, no geral, não sejam difíceis de gerenciar. Organizações também se especializam, dando diferentes responsabilidades às pessoas, consequentemente elas tomas diferentes decisões.
Finalmente, organizações ajustam as avaliações de desempenho para refletir as conseqüências de atividades gerenciais específicas. Por exemplo, o responsável por decisões referentes a propagandas não deveria ser avaliado exclusivamente de acordo com a lucratividade da empresa, mas pelo grau em que a propaganda atinge o que dela era esperado atingir. Todas estas técnicas podem, com certeza, ser incorporadas às simulações gerenciais.