Autor de mais de 11 livros na área contábil-financeira, o Prof. Dr. José Carlos Marion acredita que a principal falha no ensino da administração e da contabilidade no país seja a falta de um método que incentive o aprendizado. Em entrevista exclusiva, o professor titular do Departamento de Contabilidade e Atuária da FEA/USP e coordenador dos cursos de Ciências Contábeis do IMES e UMC Villa-Lobos falou sobre seu novo livro e sobre a importância da simulação empresarial no processo de ensino-aprendizagem.
Do que trata especificamente essa última obra que o senhor está produzindo?
José Carlos Marion – O livro chama-se Metodologias para o Ensino na Área de Negócios. Quando digo negócios, me refiro ao ensino da administração, da contabilidade, dos cursos de gestão, etc. Esse é um tema que tenho pesquisado há bastante tempo. Eu ministro essa disciplina no curso de mestrado da USP, mestrado da PUC e também na Florida Christian University, nos EUA. O que eu vejo é que a maioria dos professores na área de administração e contabilidade são bons profissionais mas tem muita dificuldade em dar aula. Falta uma base mais pedagógica, mais didática para ministrar. Portanto estou desenvolvendo e propondo alguns métodos de ensino.
Então este é um livro voltado especificamente para os docentes?
José Carlos Marion – Basicamente sim, embora no primeiro capítulo eu fale sobre a arte de ensinar, já que todos nós na vida somos professores. Quando você trabalha numa empresa, você tem sempre alguém a quem ensinar, passar serviços. Quando você é pai você é professor do seu filho. Por exemplo, eu tenho um filho de 15 anos que de vez em quando me pergunta o que é CDB, porque o dólar baixa, enfim, em toda atividade nós ensinamos alguma coisa. Para isso é preciso ter metodologia, habilidade para explicar. Num certo sentido o livro é para todo tipo de professor que existe no mundo, ou seja, todos nós.
Porque o senhor decidiu abordar os Jogos de Empresas em seu livro?
José Carlos Marion – No livro eu falo de um aspecto fundamental: o aluno como agente ativo no processo de ensino-aprendizagem. Hoje nós temos aulas expositivas em que o aluno fica às vezes sonolento, o professor fala o tempo todo. Nesses casos o estudante é sujeito passivo no processo ensino-aprendizagem. O que eu mostro é que o ideal é o aluno ser ativo, trabalhar, ser criativo, solucionar problemas, desenvolver seu potencial e não só receber informações mastigadas do professor. Dentro desse processo existem dois métodos que eu considero excelentes: o estudo de caso e o jogo de empresas. No Brasil, o estudo de caso quase não se desenvolveu. É um método norte-americano, de Harvard, que não encontrou aqui condições de aplicação.
Já na área de jogos de empresa existem muitos métodos e um dos melhores que eu conheço é da Bernard – exatamente por isso que fiz o contato com o professor Ricardo Bernard. O fato de existir uma técnica que funciona – em prática na Universidade Federal de Santa Catarina – aplicada pelo professor Ricardo, faz com que o processo seja mais simples do que o estudo de caso. Entre esses dois métodos eu acabei optando pelo da simulação por já se ter resultados positivos. Creio que com a ajuda da Bernard nós poderemos aplicar o método o mais cedo possível em muitas instituições no Brasil.
Na sua opinião, quais são as falhas no ensino da administração e da contabilidade nos cursos universitários?
José Carlos Marion – Acho que a principal falha é exatamente no método. Às vezes os professores reclamam que os alunos estão dispersivos, mas o problema não está no aluno e sim no método de ensino. Os modelos tradicionais são métodos cansativos e isso faz com que o estudante não se sinta motivado, não existe uma aplicação prática do que ele aprende. Quase sempre o aluno faz exercícios de situações que não são reais, que não são vivenciadas. Nesse sentido o estudo de caso e os jogos de empresas têm a grande vantagem de trazer realidades simplificadas para a sala de aula.
As estatísticas mostram que quando o aluno ouve uma aula ele grava em média 20% do conteúdo. Se ele ouvir e ver a apreensão pode chegar a 40% da aprendizagem. Agora, se o estudante aplicar o conhecimento, chega a captar 90% do conteúdo. Então hoje falta realidade na sala de aula, fica tudo muito teórico, sem vida.
A Bernard acaba de fechar um contrato com a Uniguaçu para a utilização do software no curso de Agronegócio. Na sua opinião, como a simulação pode auxiliar profissionais deste ramo?
José Carlos Marion – Eu tenho alguns trabalhos na área de agronegócios, e quando a gente fala em agrobusiness fica tudo muito no campo da teoria, embora já existam alguns estudos de caso. No entanto, quando tem-se um estudo de caso, vê-se que são realidades muito específicas. Além disso, fica um pouco difícil dentro de uma faculdade levar alunos para estágios nessa área, que geralmente estão localizados fora dos grandes centros. Então o ideal é trazer as simulações para a sala de aula, através das simulações. E eu sempre digo para os meus alunos que aqui é o laboratório, onde eles podem errar. Além disso, a grande vantagem das simulações é também a possibilidade de que vários cenários sejam colocados.
O senhor acredita estar havendo uma maior conscientização em relação ao uso da simulação no processo de aprendizagem ou o método tradicional de ensino ainda é predominante?
José Carlos Marion – Infelizmente o método tradicional ainda é majoritário. Eu creio que hoje ainda mais de 90% das instituições de ensino trabalhem com o método tradicional por vários motivos. O principal deles é que os professores tem uma certa ojeriza, um certo medo. Eles acham que é algo complicado demais, e hoje, grande parte dos docentes não são recém formados, são pessoas de 10, 20 anos de formados, e naquela época a tecnologia não era tão importante, esses métodos não eram tão significativos. Há um certo preconceito.
Além disso as próprias instituições de ensino têm um pouco de dificuldade de terceirizar um serviço, pois esses métodos, como é o caso dos softwares da Bernard, podem ser aplicados em qualquer lugar, e as instituições ficam amedrontadas, se perguntam se terceirizar não tiraria a credibilidade, se eles não deveriam estar criando isso lá dentro. Como se em outras áreas se criasse alguma coisa, por exemplo, os livros didáticos são trazidos de fora para dentro.